Lawrence, em trajes árabes típicos dos beduínos. |
Thomas Edward Lawrence,
popularmente conhecido como “Lawrence da Arábia”, foi um arqueólogo e agente
secreto britânico que desempenhou um papel fundamental nas campanhas do Oriente
Médio durante a Segunda Guerra Mundial. Lawrence liderou grupos tribais árabes
em uma insurreição contra o Império Turco Otomano.
Lawrence ainda adolescente, sentado à esquerda, junto com seus irmãos. |
Tremadog
Nascido em Tremadog, na
província de Wales, em 16 de Agosto de 1888, Edward Lawrence demonstrou um
gosto por aventuras e História desde muito cedo. Um dos cinco filhos de Thomas
Chapman e Sarah Junner, ele estudou em excelentes escolas que lhe deram ainda
mais atração pelas artes e pelas ciências, sobretudo em Arqueologia e estudos
orientais. Aos 15 anos de idade, Lawrence e seu amigo Cyril Beeson viajaram de
bicicleta por Oxfordshire, Berkshire e Buckinghamshire, visitando diversas
igrejas, museus, monumentos e antiguidades. Os dois amigos também viajaram de
bicicleta para a França, fazendo anotações e observando diversos castelos
medievais.
Lawrence em seu uniforme de oficial do exército britânico. |
Hogarth e Woolley
De 1907 a 1910 Lawrence
estudou História no Jesus College, em Oxford. Em 1909 ele fez uma caminhada de
três meses pela Síria, na época dominada pelo império otomano, percorrendo
1600km a pé. Com o trabalho intitulado The
influence of the Crusades on European Military Architecture – to the end of the
12th century (A influência das Cruzadas na Arquitetura Militar Europeia –
até o fim do século XII). Junto com D.G. Hogarth e Leonard Woolley, a serviço
do Museu Britânico, participou de diversas escavações arqueológicas pelo
Oriente Médio. Lawrence publicou diversos trabalhos em Grego antigo, Francês e
Árabe.
Agentes secretos
Em 1911, Lawrence
viajou para a cidade de Beirute, e de lá foi para Carquêmis, trabalhando com
Leonard Woolley em projetos de arqueologia. Junto com Flinders Petrie, trabalhou
em missões arqueológicas em Ammar, no Egito. Lawrence e Woolley foram
contratados pelo serviço britânico de inteligência para atuarem como agentes
secretos em missões de reconhecimento territorial. A intenção do governo
britânico era permitir um trabalho de espionagem em território turco camuflado
de “pesquisas arqueológicas”.
Nômades revoltosos
Com a eclosão da
Primeira Guerra Mundial, os britânicos viram a necessidade vital de organizar
missões militares na Arábia contra o Império Turco Otomano, abrindo uma nova
frente de batalha. Diversos povos árabes se revoltaram contra o domínio
imperial otomano, e Lawrence exerceu um papel decisivo como mediador entre a
Grã-Bretanha e estes insurgentes. Junto com os líderes árabes Faisal e Abdullah
e suas tropas irregulares, Lawrence orquestrou missões de guerrilha contra
tropas otomanas.
Em primeiro plano, o líder árabe Faisal, grande amigo de Lawrence. Lawrence está em segundo plano, e é o segundo da direita para a esquerda. |
Tomar Meca, ou não?
O plano original dos líderes árabes consistia em fazer um
ataque frontal contra os otomanos na cidade sagrada de Meca. Mas Lawrence, em
conjunto com Herbert Garland, convenceu os comandantes árabes a desistir de um
choque direto e permitir a entrada das tropas turco-otomanas em seus
territórios. Imersos em um deserto e com uma linha demasiadamente prolongada,
os inimigos teriam dificuldades em receber suprimentos e manter suas posições,
tornando-se presas mais fáceis para ataques de guerrilha. A estratégia foi um
sucesso e o movimento insurgente árabe tomou um caráter de guerrilha. Os
otomanos foram obrigados a retirar tropas estacionadas na cidade de Meca, e com
a estrada de ferro frequentemente atacada, acabavam perdendo tempo cuidando dos
danos e tentando resolver outros problemas causados pelos guerrilheiros.
Lawrence em roupas árabes típicas |
O porto de Yanbu
Os otomanos movimentaram unidades navais com a ambição de
tomar o importante porto de Yanbu, localizado em um ponto estratégico do mar
Vermelho, em Dezembro de 1916. Lawrence havia feito uma grande amizade com
Faisal, que liderava o Exército Árabe do Norte. Sabendo que seria impossível
deter a movimentação naval dos otomanos, Lawrence conseguiu convencer os
britânicos a enviar unidades navais para deter os turcos. Com sucesso, os
navios turcos foram derrotados e o porto de Yanbu permaneceu intacto.
Aqaba
Lawrence conseguiu organizar diversos grupos insurgentes,
como as forças de Auda Abu Tayi (anteriormente empregadas pelos otomanos), e em
1917 coordenou estes grupos para atacar a cidade estratégica de Aqaba. No dia 6
de Julho, após um ataque coordenado por terra, a cidade caiu nas mãos dos
insurgentes. Lawrence foi promovido ao posto de major e comandante-em-chefe da
Força Expedicionária Egípcia. O general
Sir Edmund Allenby chegou a dizer sobre ele o seguinte: “Eu lhe dei liberdade para agir, e sua cooperação foi marcada pela maior
lealdade, e eu nunca tive nada a não ser orgulho de seu trabalho, o qual, de
igual modo, foi inestimável. Lawrence é a primavera do movimento árabe e sabe
sua linguagem, suas maneiras e sua mentalidade”. Lawrence agora era o
principal líder e estrategista do movimento, conselheiro pessoal de Faisal e o agente
favorito do general Allenby.
Lawrence e Faisal, um dos mais importantes líderes árabes da revolta contra os otomanos. À frente, o primeiro ministro britânico, Winston Churchill. |
Tafileh
No sudoeste do Mar
Morto há uma importante região chamada de Tafileh. Nessa localidade aconteceu a
mais importante batalha do Oriente Médio durante a Primeira Guerra Mundial. Os
turcos tomaram a ofensiva, e a defesa da região coube a Lawrence e Jafar Pasha
al-Askari, líder de um exército árabe regular. A batalha não estava favorável
para nenhum dos dois lados, e foi especialmente difícil e exigiu muita
habilidade por parte dos estrategistas. Os turcos foram vencidos e Tafileh foi
mantida sob o controle dos insurgentes. Lawrence recebeu o distintivo de Ordem
de Serviço Distinto e foi promovido a tenente coronel.
Reputação e honra
Um caráter é especialmente
notado em Lawrence. Diferente da maioria dos agentes ocidentais no oriente, que
trabalhavam mais com recompensas financeiras e subornos, sem levar em
consideração a cultura, a religião e os costumes dos povos da região, Lawrence
imergiu no mundo e na cultura árabe de uma forma profunda. Muitas vezes, usava
as roupas características de um chefe árabe. Comia e dormia com eles, muitas
vezes em tendas. Os turcos chegaram a fixar uma recompensa de 15 mil libras por
sua cabeça, mas nunca precisaram pagar esse valor. Um oficial turco chegou a
escrever o seguinte ao seu respeito: “Apesar
de colocarmos uma recompensa de 15.000 libras por sua cabeça, nenhum árabe,
ainda, sequer tentou traí-lo. o Sharif de Meca, o rei de Hedjaz, deu a ele um
status igual ao de seus filhos, e ele é simplesmente como o aço temperado que
suporta toda a estrutura de nossas influências na Arábia. Ele é um cavalheiro
muito inspirador e aventureiro”. Lawrence foi um dos poucos homens que
conquistou o respeito de seus amigos e inimigos.
Damasco
A próxima cidade alvo
dos insurgentes foi Damasco. Nas semanas finais da Primeira Guerra, Lawrence
deveria capturar a cidade. No dia 1 de Outubro de 1918, a cidade sucumbiu aos
atacantes. A vitória não foi recebida por Lawrence, entretanto. Emir Said, governante
da cidade, rendeu-se oficialmente ao major Harry Olden, líder da 10ª Brigada
Australiana de Cavalaria Leve. Lawrence sabia dos riscos de governos
instituídos pelas potências ocidentais naquela região, contrários aos desejos
de liberdade daqueles povos. Mas os generais franceses Gouraud e Mariano Goybet
colocaram um governante fantoche na região, o que arruinou os desejos de
independência árabe que Lawrence tanto ajudou a cultivar.
Lawrence (no carro, de turbante) entrando na cidade de Damasco. |
Jogos Políticos
Nos últimos anos da
guerra, Lawrence procurou convencer os seus superiores de que garantir a
independência das nações árabes era muito interessante para a Grã-Bretanha em
termos econômicos e políticos. Mas, apesar das promessas feitas pelas autoridades,
um acordo entre França e Bretanha, chamado de Sykes-Picot, instalou governantes
fantoches nas regiões “libertadas”. Assim, os árabes que lutaram contra a
dominação otomana acabaram caindo nas mãos da exploração imperialista europeia.
No centro, Faisal e Lawrence. |
Pós-guerra
Promovido a coronel,
Lawrence voltou para a Inglaterra ao fim da guerra. Começou a trabalhar no
Escritório Estrangeiro, participando da Conferência de Paz de Paris, como membro
da delegação do líder árabe Faisal. Atuou também como conselheiro de Winston
Churchill. Lawrence sofreu um acidente de avião em uma viagem ao Egito, que
caiu no aeroporto de Roma. O piloto e o copiloto morreram, mas Lawrence
sobreviveu, tendo apenas quebrado alguns ossos. Durante sua internação, foi
visitado pelo rei Victor Emmanuel III. Em 1919, Lawrence foi fotografado em
roupas árabes pelo fotógrafo Thomas, e estas fotos ajudaram a divulgar a imagem
pública de Lawrence, que se tornou famoso.
RAF e RTC
Lawrence falsificou
documentos e mudou seu nome para John Hume Ross. Tentou ingressar na Royal Air
Force (RAF), mas foi impedido por W. E. Johns, que identificou a falsificação
dos documentos. Por conta de ordens superiores, Johns foi obrigado a aceitar
Lawrence na RAF. Mas em 1923, Lawrence teve de sair novamente da RAF por conta
de sua fraude ter sido publicamente exposta. No mesmo ano, ele serviu na Royal
Tank Corps (RTC). Em 1925, ele voltou à RAF. De 1926 a 1928, ele serviu em um
posto distante na Índia, na época governada pelos britânicos. Ele trabalhou até
1935, terminando sua carreira em Bridlington, na parte Leste de Yorkshire.
Lawrence também foi um apaixonado por motociclismo, chegando a adquirir uma
clássica Brough Superior SS100, hoje exibida no Museu Nacional de Motos, em
Beaulieu, e outra de suas motos está em exposição no Museu Imperial de Guerra
em Londres.
Morte
Aos 46 anos,
Lawrence morreu em um acidente de moto com sua Brough Superior SS100, em
Dorset. Um ponto cego em uma estrada impediu-o de ver dois garotos na pista, e
ao desviar deles, Lawrence perdeu o controle da moto, bateu contra as barras de
proteção e foi arremessado no ar com o impacto. Faleceu seis dias depois de sua
internação, em 19 de Maio de 1935. Um pequeno memorial foi construído no local
de seu acidente.
Lawrence em sua moto Brough Superior SS100 |
Sete Pilares de
Sabedoria
Lawrence foi o
principal agente ocidental nas ações políticas e militares no Oriente Médio
durante a Primeira Guerra Mundial. Ajudou os árabes insurgentes em sua luta
contra o Império Otomano. Mas foi além: defendeu a criação de Estados árabes
independentes e autônomos. Um dos médicos que o atendeu em seus dias finais, o neurocirurgião
Hugh Cairns, realizou uma série de estudos sobre os acidentes de moto fatais e
os impactos cranianos como a maior causa de mortes em acidentes desse tipo, o
que levou ao uso de capacetes de segurança aprimorados. Lawrence também
escreveu muito: centenas de cartas, inúmeros textos e o seu mais famoso livro, Seven Pillars of Wisdom (Sete Pilares da
Sabedoria), uma autobiografia onde ele relatou suas ações militares na Arábia. Traduziu
A Odisseia, de Homero, para o Inglês,
bem como o conto medieval francês chamado The
Forest Giant (O Gigante da Floresta). Seu livro e suas traduções lhe
renderam um bom dinheiro.
Legado
Lawrence também
teve contato e amizade com grandes nomes intelectuais, como Bernard Shaw, Winston
Churchill, Noël Coward, Edward Elgar, Robert Graves, Siegfried Sassoon, E. M.
Foster, Augustos John, Henry Williamson e John Buchan. Um busto foi erguido em
sua homenagem na cripta onde ele está enterrado, na Saint Paul’s Cathedral, em
Londres. Lawrence ajudou a formar o espírito necessário para a criação dos
modernos Estados árabes, bem como propagou sua cultura em todo o mundo
ocidental. Sua vida virou filme, e Lawrence da Arábia é um dos títulos
clássicos mais famosos e assistidos. Sem ele, os eventos no Oriente Médio
teriam sido totalmente diferentes.
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